terça-feira, setembro 13, 2011

História de Vida

Existem textos que de deixam sem palavras.
Este é um deles. É uma história.....que só lendo.


Quando era uma pequena menina indefesa fui brutalmente agredida pela minha mãe. Ela bateu-me tanto que me tornei numa poça de sangue, mas fui salva pela minha avó que me levou para o hospital. Este espancamento deveu-se ao facto da minha avó não querer dar dinheiro à minha mãe para ela ir comprar droga. E ela decidiu retaliar em mim. Eu odiava a minha mãe e não sabia o que era ter um pai. A minha mãe nunca falou dele a ninguém e ai de quem a questionasse acerca desse assunto.


Cresci num ambiente muito violento. Existiam agressões diárias psicológicas, verbais e físicas. Quando fiz 18 anos, a minha avó morreu e as coisas deterioram-se mais. Passei a ter uma vida ainda mais miserável em que não havia nada para comer e em que por vezes era expulsa de casa pela minha mãe. E era assim obrigada a dormir na rua, com medo, com frio, com chuva, com fome. A mendigar esmolas e comida a todos os que passavam na rua.


Não continuei os estudos, pois estava fora de hipótese ir para a Universidade. E eu só tinha conseguido concluir o 12º por causa da minha avó. Por isso, fui trabalhar como empregada de mesa. Estava com esperança que ao começar a ganhar dinheiro a minha vida viesse a melhorar. Mas a minha mãe agredia-me violentamente e obrigava-me a dar-lhe todo o dinheiro que eu ganhava para ela gastar em álcool e drogas. Nunca havia comida em casa, mas felizmente podia almoçar e jantar no Restaurante onde trabalhava. Eles conheciam a minha situação e davam-me comida.


Com 20 anos sentia-me uma mulher velha com os sonhos desfeitos que vivia aterrorizada e cuja única preocupação era matar a fome. Tinha de assistir constantemente às ressacas da minha mãe e às agressões que existiam entre ela e outros drogados que frequentavam todas as semanas a nossa casa. Estava mergulhada numa tristeza tão grande que um dia desesperada decidi que queria esquecer tudo e injectei-me. E senti-me leve e livre de toda aquela miséria. E claro, viciei-me naquela sensação de liberdade. Tornei-me eu própria dependente. Eu só ía trabalhar para ganhar dinheiro para a droga. Agora as guerras entre eu a minha mãe eram sobre quem ficava com mais, quem se podia injectar mais vezes.


Comecei a ficar escanzelada. Parecia uma morta viva e a minha dependência tornou o meu comportamento intolerável. Fui despedida e voltei à miséria. Não tinha nada porque lutar, restava-me morrer com uma overdose ou de fome.


Uma manhã bateram à porta. Fui abrir e era um senhor muito bem vestido que perguntava pela minha mãe. Eu disse-lhe que ela tinha saído e ele perguntou se eu era a Carla. Respondi que sim e ele disse-me que era o meu Pai. E abraçou-me a chorar. Eu sentia-me confusa e desconfortável, mas não tinha forças para o afastar e perguntar-lhe. Sim, porque eu tinha tantas perguntas na minha cabeça...


Ele contou-me que a minha mãe me tinha roubado dele quando ele a ameaçou tirar-me dela se ela não fosse para uma Clínica fazer uma desintoxicação. Na altura eu tinha 6 meses. Ele procurou por mim este tempo todo…e isso fazia-me feliz. Era uma sensação tão estranha. Eu nunca me tinha sentido feliz. E já tinha 25 anos.


O meu Pai disse-me que iria cuidar de mim de agora em diante, proteger-me e levar-me dali. Fiz as malas e vim embora com ele. Eu tinha um motivo para viver e eu queria lutar. O meu Pai ajudou-me a fazer a desintoxicação (nunca mais me aproximei de drogas), ajudou-me a voltar a estudar e consegui terminar uma Licenciatura em Psicologia, ajudou-me a acreditar em mim e deu-me amor, carinho, compreensão e colo. O meu Pai fez-me acreditar nos seres humanos e na vida.


Aos 42 anos apaixonei-me a sério. O Eduardo era um homem tão gentil, tão sereno, tão terno. Fomos viver juntos passado um ano. Todos os momentos que passamos juntos foram extraordinários, mas ele queria ter filhos e eu não me sentia capaz de ser mãe. Pela idade, por tudo o que passei…e ele não compreendia. E os nossos caminhos separaram-se. Quando olho para trás sinto que fui cobarde. Eu podia ter tentado mais.


Passaram-se dois anos e estava sozinha. Tinha o meu trabalho e o meu pai. Sentia-me incompleta. E decidi ultrapassar os meus medos e adoptar sozinha uma criança. E conheci a Maria já na fase de adolescência. Era uma rebelde encantadora e foi amor à primeira vista para ambas. Até todo o processo ter sido concluído foi muito complicado, mas valeu a pena. Ela faz-me muito feliz e sinto que ao ser mãe dela, ao cuidar dela estou a libertar-me do meu passado. Ser mãe é uma coisa maravilhosa.


No início deste ano conheci o Shiuuuu por acaso e decidi enviar um segredo a contar uma parte da minha infância maldita. Daí recebo um e-mail dos administradores a informarem-me que alguém que tinha visto o segredo gostaria de conversar comigo e que se chamava Eduardo… Seria? E naqueles acasos que só acontecem na imaginação ou nos filmes ou nos sonhos eu voltei a encontrar o Eduardo que continuava sozinho.


Claro que voltamos a reviver o nosso amor. Claro que já vivemos juntos e felizes. Na nossa idade é proibido perder tempo. A Maria adora o Eduardo e ele faz tudo por ela.


Sou feliz. Graças ao meu Pai, à Maria, ao Eduardo, ao Shiuuuu e a mim.


Obrigado a todos. Sou uma mulher completa.

Retirado do blogue SHIUUUU

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